quinta-feira, 17 de novembro de 2016

Vestígios arqueológicos ajudam a reconstruir a história da ocupação da Amazônia

MCTIC
17 de novembro de 2016

Vestígios arqueológicos são analisados em laboratório por pesquisadores do Instituto Mamirauá. Foto: MCTIC

Arqueólogos do Instituto Mamirauá e universidades federais analisam cerâmicas e pedaços de pedra, carvão ou ossos encontrados na região do Médio Solimões. Vestígios oferecem informações sobre o período pré-colonização.

Uma equipe de pesquisadores está analisando os vestígios arqueológicos coletados no interior do Amazonas no último mês. Além de cerâmicas, produzidas por populações indígenas, os pesquisadores encontraram, durante a escavação em um sítio arqueológico próximo a Tefé, terra preta de índio e outros materiais que podem ser pedaços de pedra, carvão ou ossos. Todo esse material será usado pelos pesquisadores que buscam desvendar a história da ocupação humana na Amazônia, antes da chegada dos colonizadores.

"O que estamos trabalhando é a história de longa duração dessas populações", explica o arqueólogo Eduardo Kazuo Tamanaha, do Instituto Mamirauá."Esses vestígios, quando estavam inteiros ou eram utilizados por alguém, representaram uma cultura, um momento da história. Basicamente, aquele antigo utensílio serviu a algum propósito na sociedade. E nós, arqueólogos, tentamos reconstruir essa história antiga através desses objetos e seu contexto."

Junto com outros dez pesquisadores, Kazuo passou um mês em campo participando das escavações no sítio próximo a uma comunidade ribeirinha, na foz do lago Caiambé. O trabalho foi realizado pelo Instituto Mamirauá em parceria com a Universidade Federal de Sergipe, Museu de Etnologia e Arqueologia da Universidade de São Paulo e Universidade do Estado do Amazonas, por meio do Centro de Estudos Superiores de Tefé (Cest).

Para o pesquisador Rafael de Almeida Lopes, da Universidade Federal de Sergipe, os vestígios podem revelar duas tradições culturais de produção cerâmica na região do Médio Solimões. "Buscamos entender como se deu a presença dessas populações que produziram as cerâmicas arqueológicas que encontramos aqui, tanto as cerâmicas da Tradição Borda Incisa quanto da Tradição Polícroma", diz.
Segundo ele, a hipótese é que populações de diferentes aldeias, que produziam cerâmicas com técnicas e metodologias distintas, estavam se relacionando.

Terra preta

Os pesquisadores afirmam que terra preta de índio, muito encontrada na Amazônia, está vinculada às antigas ocupações indígenas da região. Esse tipo de terra, muito fértil, é formado por um aglomerado de grande produção e descarte de matéria orgânica. Nesse substrato, também é encontrado material carbonizado que, ao ser analisado, ajuda na compreensão do tipo de madeira e frutas que eram consumidos pelos indígenas naquele período.

"Quando estudamos história, ainda estudamos muito da história europeia. Nós estamos buscando compreender a história indígena pré-colonial e valorizar isso dentro da realidade nacional atual. Como essas populações lidavam umas com as outras, antes do contato com os europeus? Quais as formas criativas que elas tinham para lidar tanto com o ambiente quanto com os problemas sociais?", acrescenta Rafael.

Sítio arqueológico

A região do lago Caiambé, escolhida para as escavações, foi palco de uma expedição realizada nas décadas de 1950 e 1960 pelo arqueólogo alemão Peter Hilbert. De acordo com o pesquisador Eduardo Kazuo, os vestígios encontrados por Hilbert naquela região e na cidade de Tefé eram diferentes de outras áreas e, por isso, acabaram definindo duas antigas expressões culturais do Médio Solimões nomeadas de fase Caiambé e Tefé, dois conjuntos cerâmicos regionais que fazem parte da Tradição Borda Incisa e Tradição Polícroma, respectivamente.

Eduardo Kazuo ressalta que Hilbert foi um dos pioneiros nos estudos arqueológicos na bacia do rio Solimões. "Peter Hilbert foi o primeiro arqueólogo que fez uma pesquisa sistemática na região. Antes dele, somente alguns pesquisadores, exploradores e viajantes relatavam sobre os vestígios das antigas aldeias indígenas. Então, ele teve um papel importante por inserir o Médio Solimões na arqueologia mundial."
"Queremos ampliar as escavações, responder algumas perguntas levantadas por esses pioneiros, criticar algumas questões respondidas por eles. A ideia é refinar a informação e preencher lacunas", esclarece.

Tradições

As tradições são usadas para identificar as cerâmicas arqueológicas que possuem características similares como forma, decoração, cores, matéria prima e idade. Os pesquisadores acreditam que essas similaridades podem indicar a identidade de uma ou outra cultura indígena.

É possível que as cerâmicas da Tradição Borda Incisa tenham sido produzidas em toda a região do Médio Solimões entre os anos 700 e 1000. Parte dessas cerâmicas possui decorações que imitam a forma de animais como tartarugas, pássaros e macacos. De acordo com Rafael, a cerâmica dessa tradição está associada às populações que falavam língua Aruaque. "São populações caracterizadas por fazerem redes multiétnicas, estavam em contato com outras populações e trocavam materiais, o que é uma análise interessante", avalia.

Já as cerâmicas da Tradição Polícroma são associadas a um período de ocupação mais recente, após o contato dessas populações indígenas com os colonizadores. Já foram datados vestígios entre 500 e 1.700. Elas são caracterizadas por decorações em pintura vermelha e preta sobre argila branca. Alguns arqueólogos acreditam que esse material esteja associado à dispersão de populações que se comunicavam em língua Tupi. Foram encontradas urnas funerárias com decoração antropomorfa, com rostos de animais sobre a cabeça. "O que essas urnas do Tauary ajudam a pensar é que existe alguma essência xamanística nesses personagens", conclui.

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