sexta-feira, 5 de fevereiro de 2016

Equars é dissociado do Mirax e será lançado em 2020




Jornal do SindCT
Shirley Marciano
5 de fevereiro de 2016

“Ter juntado o Mirax ao Equars em 2005 foi um dos maiores erros da ciência espacial”, diz Oswaldo Miranda, coordenador do CEA. Projetos se tornaram independentes e agora cada um dá nome a seu próprio satélite. Ao ser reavaliado pela atual direção do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE), o projeto Equatorial Atmosphere Research Satellite (Equars) ganhou vida nova. Ele sai de uma “hibernação” por limites tecnológicos e já ganha uma previsão de lançamento para 2020.

A mudança foi técnica, mas também conceitual. Ele foi dissociado do satélite Lattes, que tinha o propósito de carregar duas missões — o Equars e o Mirax. A conclusão a que se chegou foi a de que juntas, num mesmo satélite, as missões se tornariam inviáveis em função do desafio tecnológico colocado para a engenharia.

Equars e Mirax são missões bem diferentes, que executariam suas finalidades em órbitas não coincidentes. O Equars teria que funcionar ancorado num satélite equatorial para estudo da alta atmosfera e da ionosfera terrestre. O Mirax, por sua vez, é uma carga útil de captura de raios X e Gama em satélite de órbita polar.

Portanto, seriam ângulos de visada distintos, um desafio muito além das possibilidades e da maturidade atual do INPE. Agora, cada projeto contará com um satélite próprio, o qual terá o nome de sua respectiva missão. O satélite Equars está bem avançado, mas o Mirax passará por muitos testes ainda para ser concebido enquanto satélite. A ideia de criar um satélite científico surgiu na década de 1990: o Brasil já tinha uma certa experiência por ter desenvolvido os satélites da série SCD e SACI.

Mas o objetivo era construir satélites de menor porte, da classe de 100 quilos a 150 quilos. Foi nesse momento que surgiu o Equars, que teria a missão de estudar a alta atmosfera terrestre, e o seu cronograma de desenvolvimento fecharia em 2008. Até 2003 tudo correu bem, porque ele era um projeto de satélite independente.

A junção dele com o Mirax para ser carga útil do satélite Lattes ocorreu em 2004 e 2005. Nesta época o Equars estava bem avançado, já tinha passado pelas fases “0” e “A” do projeto de arquitetura do satélite e até já constava no Programa Nacional de Atividades Espaciais (PNAE).

Fusão desastrosa

“Num dado momento, não sei por que, tomou- -se a decisão de fundir as duas missões, Equars e Mirax, criando-se o satélite científico Lattes, que usaria uma plataforma multimissão (PMM). Juntá-los foi uma proposta desastrosa, um erro imensurável.

Não que não se possa reavaliar um projeto e mudá-lo, mas tudo isso tem que vir embasado em pareceres técnicos, que expliquem qual a vantagem em alterá-lo. Até hoje não vi nada aqui no INPE sobre esse assunto. Este foi, sem dúvida, o maior erro que já vi na área de ciências espaciais”, revela Oswaldo Duarte Miranda, coordenador de Ciências Espaciais e Atmosféricas (CEA) do INPE e vice-diretor do instituto.

A fusão dos projetos acabou trazendo diversos prejuízos, entre os quais o atraso e uma certa desmoralização, pois o objeto da pesquisa era complexo demais para o INPE naquele momento. Por essa razão, o Equars acabou caindo em descrédito junto aos parceiros internacionais — Canadá, Japão e EUA — que declinaram da ideia de testar seus três respectivos instrumentos. Apesar disso, o INPE continuou acreditando nos cinco instrumentos brasileiros restantes, embora o satélite estivesse paralisado.

Hoje três deles já estão qualificados e os outros dois em fase de engenharia, com vistas a obterem a qualificação em breve. “Assim que o [Leonel] Perondi assumiu a direção do INPE, conversamos no sentido de questionar a viabilidade do Lattes. Então ele decidiu fazer um estudo de engenharia, o qual concluiu que seria necessário separá-los para dar prosseguimento aos dois projetos.

Sou contra ficar floreando. Errou, pare, reavalie e conserte. É preferível enfrentar o problema do que ficar fazendo arranjos mal ajeitados. Nosso país não pode trabalhar com esse tipo de passivo. Essa decisão já deveria ter sido tomada há muito tempo, pois esse satélite é de grande importância para o Brasil e para as empresas nacionais também”, enfatiza o vice diretor.

Os experimentos estão avançados e já há a decisão de fazer uma arquitetura de satélite para o Equars. Também será necessário desenvolver uma Plataforma Multimissão (PMM) para ele. Em 2004, havia um convênio com a França para criar-se uma PMM para satélites de até 150 quilos, que se destinava ao Equars. Porém, a fusão com o Mirax inviabilizou a parceria, em razão do peso: sozinho, o Mirax teria 200 quilos. Assim, partes do que seria a chamada “PMM franco- -brasileira” se tornaram peças de museu, sem destinação útil.

Os cinco instrumentos que serão embarcados no Equars são:

(Foto: Inpe)

1. Elisa (analisador eletrostático). Destina -se a medir o espectro de energia dos elétrons. Ele vai focar no estudo da anomalia magnética da América do Sul, onde esse material entra muito mais fundo na atmosfera. Por essa razão, tem uma quantidade muito maior de partículas que vêm do Sol, dos meios interplanetário e interestelar, que avançam em direção à superfície terrestre.

Essa anomalia estava sobre o Atlântico Sul, mas migrou e está sobre o Brasil. Nos próximos dez anos ela deve chegar à costa do Pacífico. “O ideal seria estudar esse fenômeno agora, porque estamos com uma ionosfera muito mais agitada, o que traz uma riqueza enorme no que diz respeito a materiais para estudo.

Tanto é que quando os satélites passam pela anomalia, muitos deixam os sistemas em stand by para evitar interferência”, explica Miranda.

2. Glow (fotômetro Airglow). Estuda a dinâmica da alta atmosfera e ionosfera. É um instrumento para medir a aeroluminescência atmosférica; os processos fotoquímicos. Durante o dia, a alta atmosfera é bombardeada por fótons (raios solares). Isso provoca excitação dos átomos e das moléculas, o que os deixa ionizados. Quando chega a noite, eles devolvem toda essa energia recebida em forma de luz.

Pretende-se saber como as partículas são ionizadas e como são transportadas de uma camada para outra.

3. Grom (receptor GPS). No espaço há vários satélites GPS. Então, quando o transmissor do Grom capta o sinal deles, recebe diversas informações de medidas do perfil atmosférico, como pressão, temperatura, quantidade de vapor de água e outros. São dados importantes que são utilizados também para a meteorologia.

4. Ionex (sondas ionosféricas).

Destina-se a tomar medidas do plasma ionosférico, como o número de partículas e a distribuição de sua temperatura, e também medir todo sinal de rádio que cruza a atmosfera terrestre, que vai para um satélite de telecomunicação ou um satélite GPS. Quando ocorre uma tormenta solar, as condições ionosféricas mudam e isso interfere nos GPSs.

Sabendo dessas condições, é possível reprogramar as orientações a serem enviadas. “Imagine um avião em piloto automático, que depende do GPS para definir sua altitude. Então, essas informações são muito preciosas”, diz Miranda.

5. Apex (medidor de prótons e partículas alfa). Estuda principalmente os raios cósmicos.

Mede quantidade e densidade de prótons e das partículas alfa (íons de carga 2+ com dois nêutrons e dois prótons) que estão na ionosfera. Todas essas informações servirão de subsídio para várias áreas e grande parte delas será compilada pelo grupo de Estudo e Monitoramento Brasileiro do Clima Espacial (Embrace), do INPE. Após o lançamento, serão utilizadas as mesmas estações receptoras de dados em solo: de Cuiabá (MT) e de Alcântara (MA). Ainda não há definição sobre a plataforma e nem a contratação do lançador.

DADOS TÉCNICOS

Eixos: 3

Peso total: 100 kg aproximadamente

Carga útil: 35 kg aproximadamente

Dimensões: dependem do resultado do estudo da arquitetura, que ficará pronta em março de 2016

Potência: 100 W aproximadamente

Órbita equatorial: entre 650 Km e 750 Km de altitude, com inclinação de 20°

Modelo de sistema de controle de atitude: simples

Sistema de apontamento: 1°

Cronograma: integração em 2018 e lançamento em 2020

Custo: ainda em estudo, mas deve ficar em torno de R$ 50 milhões, que virão por meio do PPA (2016-2019) e do Edital Fapesp-Finep (parceria com o INPE

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